Legislação prevê prazo de 90 dias para empreendedor (DNIT) apresentar os estudos ambientais e mais 90 dias para o licenciador (Ibama) avaliar o pedido
(Foto: Arquivo A CRÍTICA)
A nova Licença Ambiental Especial (LAE), criada após o Senado aprovar a medida provisória 1.308/2025, na quarta-feira (3), deve acelerar o processo de licenciamento da rodovia BR-319 (Manaus - Porto Velho). A legislação, porém, não garante que a recuperação dá estrada vá ser aprovada pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).
A medida provisória substitui o trecho vetado pelo presidente Lula (PT) no Projeto de Lei 2.159/2021 (Lei Geral do licenciamento Ambiental), que criava a LAE. Ao derrubar esse trecho, o governo apontou que a licença especial prevista naquele projeto tinha somente uma fase de análise (monofásica), o que não poderia ocorrer.
Antes de ser aprovada em uma sessão que durou 90 segundos no Senado, a medida provisória também passou pela Câmara dos Deputados por meio de um Projeto de Lei de Conversão 11/2025.
Rodovia estratégica
A nova legislação prevê que empreendimentos considerados estratégicos por um Conselho de Governo, formado pelos ministérios da gestão federal, terão acesso garantido por esse tipo de licenciamento mais rápido.
O Artigo 6 da nova Lei vai além e já garante que rodovias anteriormente pavimentadas sejam automaticamente consideradas estratégicas, o que faz com que esse tipo de projeto, exatamente o da BR-319, não precise ser avaliado pelo Conselho de Governo, evitando um risco de negativa.
“São consideradas estratégicas as obras de reconstrução e repavimentação de rodovias preexistentes cujos trechos representem conexões estratégicas, relevantes na perspectiva da segurança nacional, do acesso a direitos sociais fundamentais e da integração entre unidades federativas”, diz o trecho.
Prazos
Para acelerar projetos considerados estratégicos, a Lei estipula um prazo de 12 meses para análise e conclusão do licenciamento ambiental na modalidade especial. No entanto, em relação à BR-319, o rito pode ser ainda mais rápido.
Isso porque, a legislação prevê que nos casos em que o Ibama já tiver atestado a viabilidade ambiental da obra, os estudos necessários à decisão sobre a fase de instalação deverão ser protocolados pelo empreendedor — no caso da BR-319, o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) — em até 90 dias a contar da publicação da nova Lei.
Como a BR-319 já possui a Licença Prévia expedida desde 2022, e aguarda apenas a Licença de Instalação, o primeiro prazo a valer seria esse de 90 dias para apresentar os documentos necessários à obtenção da licença. Após a solicitação, o Ibama terá mais 90 dias para apresentar o resultado, que pode ser de autorização ou negativa.
Solução política
A nova legislação não menciona diretamente a BR-319, mas a regra sobre estradas previamente pavimentadas se ajusta com precisão ao caso da rodovia que liga o Amazonas a Rondônia.
Um trecho semelhante constava na Lei Geral do Licenciamento aprovada pelo Congresso em agosto, em versão ainda mais ampla, pois dispensava a via de um novo processo de licença. Esse dispositivo, porém, foi vetado pelo presidente Lula à época.
O senador Eduardo Braga (MDB) lamentou a derrubada do trecho na ocasião e chegou a sugerir que a BR-319 poderia ser incluída no caso da Licença Ambiental Especial, como agora ocorreu com a legislação aprovada na quarta-feira pelo Senado.
Acelera, mas não facilita
O engenheiro civil, advogado e professor da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), Marcos Maurício Costa, diz que a nova legislação acelera a obtenção da licença para a BR-319, mas não facilita o processo. Ele atua há mais de duas décadas em favor da recuperação da rodovia.
“Essa nova legislação permite um olhar diferenciado para o licenciamento da BR-319. É uma priorização do processo, porque a estrada é considerada estratégica, mas isso não significa que vai ser deferido”, afirma ele.
Maurício explica que a celeridade do processo não prevê ignorar as etapas de licenciamento, por isso, não há facilidades. “Se o DNIT apresentar os estudos e estiverem incompletos, insuficientes, o Ibama pode pedir uma complementação ou apenas indeferir”, diz.
Outra questão que pode travar de vez o processo de licenciamento, na visão dele, é se o Ibama determinar, por meio de um termo de referência, que o empreendimento precise de uma Avaliação Ambiental Estratégica (AAE). Trata-se de um processo de apoio à decisão de licenciar ou não que considera questões ambientais, sociais e econômicas.
“A Avaliação Ambiental Estratégica é muito mais elástica do que a Avaliação de Impacto Ambiental. Ela já começa discutindo com a sociedade, por exemplo. Então, quando o governo anunciou, em julho, um plano para a BR-319, que inclui a AAE, eu disse para esquecerem a rodovia, que não vai sair. É como se começasse tudo do zero. Se a licença prévia demorou 15 anos para sair, coloque aí mais 15 anos de novo”, afirma ele.
O que trava a estrada, hoje?
Atualmente, o trecho do meio da BR-319, composto por mais de 400 quilômetros, é o mais complexo para licenciamento. A longa faixa está em uma área mais sensível da floresta, que já é pressionada pela especulação no entorno da rodovia.
O DNIT, responsável pela manutenção da BR-319, precisa solicitar o requerimento da licença de instalação para esse trecho do meio, o que ainda não fez. Em outubro, o órgão informou que submeteu, em junho de 2024, o Plano Básico Ambiental e o Relatório de Diagnóstico Socioambiental Participativo (DSAP), dois documentos necessários, mas que não completam o pacote pendente.
De acordo com o DNIT, o Ibama informou que o PBA e o DSAP só serão analisados quando os demais requisitos e condicionantes da Licença Prévia forem atendidos e protocolados em conjunto. Essa análise da documentação completa e não por partes é prejudicial ao processo, segundo o Departamento de Transportes, que não entregou tudo até o momento.
“Tais condicionantes abrangem uma ampla gama de ações, incluindo protocolos com comunidades indígenas, estudos complementares e medidas de governança socioambiental que envolvem competências de diversas instituições federais, indo além das atribuições regimentais exclusivas do DNIT”, afirmou em nota, à época. O órgão acrescentou que “a exigência colocada pelo Ibama, na prática, inviabiliza qualquer pedido imediato de Licença de Instalação”.