Artigos sobre política e sociedade. A autora é mestre em ciências políticas pela USP e jornalista com diploma da UFAM.
Quando um ministro do meio ambiente diz que vai sentar com ONGs, madeireiros, indígenas e mineradoras para discutir sobre a Amazônia você pensa ser a posição mais democrática possível, a de um conciliador. Mas quando o despreparado (e investigado por suposto enriquecimento ilícito) ministro Ricardo Salles emenda que nesta reunião de “força-tarefa” quer derrubar o “mito” (?!?) que floresta em pé vale mais do que derrubada, você tem certeza que o despreparo intelectual sobre o assunto de Salles se junta à crueldade mesmo. O ministro do meio ambiente quer destruir o que nos resta de floresta e tem o aval, desde a eleição, do presidente.
Floresta é vida, árvore é vida, o rio é vida, árvore e rio protegem vidas. É repouso de ninho de passarinho, é a folha para o chá, é a casca para o unguento que cura. Na floresta há os moradores nativos, os animais, as onças, os macacos, as araras, as cobras, vidas que contam, que valem. Nos arredores das florestas, nós, na área urbana, que pouco tem de verde, infelizmente.
Eu afirmo isso como leiga e amazônida, que a floresta vale mais em pé que deitada, mas baseada em trabalhos de grandes cientistas que estudam, conhecem e vivem na Amazônia, não um qualquer como Ricardo Salles, derrotado em três eleições consecutivas e que caiu nas graças desse governo de falidos e ignaros.
Num estudo de um dos maiores conhecedores da Amazônia e ganhador de um Nobel, o pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, Philipe Fearnside, é explicado exatamente o conceito difundido e respeitado internacionalmente de que a floresta vale, sim, mais em pé do que derrubada: o cerne do que se chama de desenvolvimento sustentável. Se derruba, replanta-se, simples assim. Tudo que se tira, devolve-se. É um empréstimo.
No seu “Environmental Services As Strategy for Sustainable Development in Rural Amazonia” Fearnside destaca que o valor da mata em pé tem o potencial de formar uma base econômica para sustentar a população no interior da região muito melhor do que a economia atual. Para fazer essa afirmação, o cientista se baseia nos serviços ambientais que a floresta amazônica fornece aos seres humanos. “São os benefícios que a sociedade recebe dela a partir das suas funções ecológicas, tais como a manutenção da biodiversidade, o ciclo hidrológico e o armazenamento de carbono, que evita o aquecimento global. O problema é que ninguém paga por estes serviços hoje, mas isto pode mudar.”
Para usá-los como estratégia para o desenvolvimento sustentável na Amazônia, no entanto, seria necessário, segundo o pesquisador, primeiro quantificá-los melhor. “Isto tem sido o foco de muitas das minhas pesquisas, especialmente sobre como evitar o aquecimento global. Depois, para poder tomar medidas contra a destruição e quantificar os seus benefícios, precisamos entender o funcionamento do processo de desmatamento, incluindo o efeito de decisões políticas, tais como a construção de estradas e a criação de áreas protegidas.”
Então: há como Fearnside dezenas de especialistas no assunto que poderiam ser ministros ou servirem de consultores às estultices de Bolsonaro. Nosso presidente que nada entende de Brasil, foi um deputado de performance pífia e está perdido como presidente. Exceto na agenda neoliberal, um sucesso, que vai passar de trator da reforma da previdência à tributária atropelando, sempre a maioria da população.
E antes de falar das ONGs, que segundo Bolsonaro são responsáveis pelo desmatamento na Amazônia, quero ver ele citar ao menos o nome de uma delas e citar uma de suas ações. Claro que há ONGs suspeitas por aí, mas quem deveria fiscalizar é cada um de nós. Mas a maioria que conheço faz o que podem para construir e não destruir na floresta.
No Amazonas temos várias, com trabalhos de formiguinhas, mas que preenchem muitas vezes o papel do Estado, que não chega a muitos ribeirinhos. Tem a Oela, que produz instrumentos musicais com restos de madeira e faz cursos gratuitos de lutheria, a FAS, que trabalha com formação de ribeirinhos para fazer turismo local e outras atividades de geração de renda sustentável, a
Que sejam bem-vindos quem entra na luta de longe como Leonardo di Caprio e Greta Thumberg, mas para nós, que sentimos nos olhos e nos narizes o ardor da mata queimando, a tristeza de ver animais mortos na destruição da floresta e peixes boiando nos igarapés poluídos, é a destruição de nossa casa, de nosso lar.