Por Giselle Falcone Medina, advogada, Juíza titular (classe dos advogados) e Ouvidora do TRE-AM. Ex-diretora da Escola Judiciária Eleitoral e, por duas vezes, ex-conselheira da OAB/AM
(Foto: Divulgação)
No Cairo, em 1951, mil e quinhentas mulheres invadiram o Parlamento egípcio. Não estavam armadas. Carregavam apenas a força da sua indignação. Por horas, permaneceram no local, exigindo o que deveria ser óbvio: o direito ao voto e à participação política. À época, metade da população egípcia, as mulheres, era impedida de votar ou ser votada. Doria Shafik, símbolo daquele levante, pagaria um preço alto por sua coragem: a prisão domiciliar imposta por um regime que temia o poder da mudança.
Esse episódio, embora localizado no tempo e no espaço, espelha uma luta universal. Em diferentes países, sob distintos regimes e culturas, as mulheres vêm sendo protagonistas de transformações fundamentais na história da humanidade. Lutaram pelo voto, pela liberdade de expressão, pelo direito ao corpo, à educação e à cidadania plena. Muitas foram silenciadas, outras invisibilizadas, mas nenhuma foi indiferente.
A história oficial, por muito tempo escrita por mãos masculinas, tentou apagar esse protagonismo. Ainda hoje, vemos resquícios dessa exclusão nas estruturas institucionais, com o machismo estrutural ainda impondo barreiras à ascensão feminina. Mas há também sinais de ruptura. A cada nova conquista, seja um cargo ocupado, uma lei aprovada ou um precedente firmado, amplia-se o espaço de fala e decisão das mulheres.
A luta de Doria Shafik é, portanto, uma metáfora poderosa: quando as portas não se abrem, é preciso empurrá-las com coragem e coletividade. O voto feminino, que hoje nos parece um direito consolidado, foi fruto de suor, dor e resistência. Assim como outras conquistas que vieram depois e outras tantas que ainda estão por vir.
Que essa memória nos sirva de inspiração e de alerta: nenhuma conquista é definitiva quando se trata de igualdade. É preciso vigilância, presença e, sobretudo, protagonismo.
Enquanto houver mulheres dispostas a invadir o Parlamento da história com ideias, coragem e justiça, haverá futuro digno para todas nós.
E que esse protagonismo se manifeste também no cotidiano: nas salas de aula, nas urnas, nos tribunais, nas comunidades e nos espaços de poder. Cada mulher que se reconhece como agente de mudança rompe, ainda que silenciosamente, as cercas simbólicas da exclusão. A história está em curso e ela é também feminina.