Urologista defende que o poder público tenha uma política pública permanente de incentivo à saúde masculina e que a campanha contra o câncer de próstata não restringisse ao Novembro Azul.
Médico urologista Cristiano Paiva defende a criação do Instituto do Homem e política de campanha permanente de incentivo à saúde do hoomem (Foto: Jeiza Russo)
O médico urologista Cristiano Paiva defendeu que o poder público tenha uma política permanente de incentivo à saúde masculina e que a campanha para que os homens procurassem ajuda médica não se restringisse somente ao Novembro Azul, que sozinho consegue levar até 15% novos pacientes todos os anos.
“Você vê que a mulher sempre está estimulada a ir ao médico, o homem não. Tanto é que nós temos o Instituto da Mulher, que eu achei fantástico, mas nós não temos o Instituto do Homem. Então, a gente tinha que realmente ter um prédio, uma estrutura dedicada a saúde masculina. Isso também é um projeto que, quem encampar, vai deixar um legado”, disse.
O profissional, chefe de residência de urologia no Hospital Universitário Getúlio Vargas (HUGV), destaca que o diagnóstico precoce do câncer de próstata dá 95% de chance de cura do paciente e defendeu a desmistificação do exame de toque, que ainda é um tabu entre muitos homens.
Quais são os principais fatores de risco para o câncer de próstata hoje?
O pico de incidência do câncer de próstata é dos 60 aos 65 anos, mas o exame deve ser iniciado, se tiver fatores de risco, aos 45 anos. E quais são os fatores de risco? Ser da raça negra, ter histórico familiar de algum parente direto com câncer de próstata e, hoje, a obesidade. São três fatores de risco. Se não tiver esses fatores de risco, posso começar aos 50 fazendo o toque, que ainda é muito mistificado, tem um tabu de alguns pacientes, mas hoje com campanhas, isso está sendo quebrado, então o paciente está vindo com menos resistência. E dosar no sangue, que a gente chama de PSA, que é aquele antígeno específico para o câncer de próstata.
Qual a principal diferença entre esses dois exames?
Em um você vai sentir a consistência da próstata. No toque, você tem a sensibilidade, a gente sente a consistência diferente na próstata. E o outro é no sangue. A célula tumoral, quando ela está crescendo, ela joga no sangue uma glicoproteína chamada de PSA, que hoje a gente dosa e todas as vezes que ela passa de 2,5, principalmente naqueles indivíduos com menos de 60 anos, liga um sinal de alerta para gente pensar em câncer de próstata.
Um exame substitui o outro?
Não, eles são complementares. Se eu fizer só o toque, a chance de acertar seria de 60% e a de errar, 40%. Se eu fizesse só o PSA, a minha chance ia subir um pouco, de acertar 70% e de errar, 30%. Mas se eu somo os dois, soma 95%. Então, um acaba ajudando o outro.
O senhor citou que pessoas negras constituem um grupo de risco. Por que isso acontece?
Na verdade, é genético. A raça negra tem mais chance de ser hipertensa, de ter algumas doenças hematológicas, como anemia falciforme, câncer de próstata. Aí entra realmente a relação genética da raça.
Que sintomas podem indicar um câncer em estágio inicial e em estágio mais avançado?
No estágio inicial, o nódulo é extremamente pequeno, não tem sintoma. Então, o paciente é assintomático e tem câncer de próstata. Mas você vai me perguntar: e quando ele já dá sintomas, quais são? O calibre do jato [de urina] diminui, o paciente vai acordar várias vezes à noite para urinar, ele vai ter aquela sensação de que não esvazia completamente a bexiga, vai ter sangue na urina em algumas vezes. E no estágio onde a doença já é metastática, ele pode ter dor óssea nas costas, na coluna, já pela metástase óssea.
Tem alguma recomendação de mudanças no estilo de vida para prevenir o câncer de próstata?
Cristiano Paiva destaca que o diagnóstico precoce do câncer de próstata dá 95% de chance de cura do paciente
Se a pessoa descobre precocemente o câncer, o que ela deve fazer na sequência?
Todas as vezes que você dá o diagnóstico de um tumor, você tem que fazer o estadiamento tumoral, o que é? É você verificar se a doença está só dentro da próstata ou se ela já saiu da próstata. Isso a gente consegue fazer hoje com ressonância, com tomografia. Tudo isso a gente consegue hoje avaliar o paciente com suspeita. Se a doença está totalmente dentro da próstata, a melhor forma de curar esse paciente é através de cirurgia, e a melhor é a cirurgia robótica. Ela tem menor taxa de complicação, de sangramento, menos dor, alguns trabalhos sugerindo até uma melhor taxa de cursa e menor taxa de sequela.
Quais sequelas mais alterar a qualidade de vida do homem?
Impotência e incontinência urinária. Esse homem, se ele não for muito bem operado, vai trocar uma patologia, que é o câncer, por duas, que são a incontinência e a impotência.
Permanentemente?
Isso. Aí nós vamos ter que correr atrás, seja com prótese, seja com esfíncter artificial. Moral da história: nós vamos ter que resolver esse problema.
Tem outros efeitos colaterais no tratamento?
Outro efeito colateral, aí eu já vou estender um pouquinho para a radioterapia, seria o que: são as lesões actínicas. É a queimadura do intestino, da bexiga que, no caso da radioterapia, que também é uma excelente opção de tratamento, esse paciente pode sofrer com isso. Pode sangrar nas fezes, na urina, ter muito incômodo na hora de urinar. Isso também altera a qualidade de vida.
Por que ainda existe tanta resistência aos exames preventivos e como o Novembro Azul ajuda a combater isso?
O Novembro Azul começou na Austrália em 2003. Em 2008, ele chegou no Brasil. A cada ano, para você ter uma ideia do impacto disso, de 10% a 15% daqueles pacientes que não iam ao urologista, ou mesmo ao médico geral, eles começam a ir. Por que? Por causa da informação. Existe o tabu? Existe, mas também existe a falta de informação. Uma coisa aqui no estado do Amazonas que a gente tem que realmente abrir os olhos é a falta de acesso. A especialidade urologia hoje, no estado, ela é muito escassa. Ela é escassa na capital, imagine no interior. Deve fazer parte da estratégia do governo um olhar para a especialidade de urologia.
Quantos casos de câncer de próstata tivemos no último ano no Amazonas?
Na região Norte toda, estão previstos para 2025, isso é estatística do Inca [Instituto Nacional de Câncer], 2.760 novos casos de câncer de próstata. No Amazonas em 2025, 570. Eu vou ser bem franco, isso aqui é a estatística da capital, que já tem certa dificuldade. O único centro que nós temos aqui é o Cecon. Se for quantificar, eu falo que, no mínimo, é o dobro, se a gente somar a capital e o interior.
O que o Estado pode fazer para aumentar as políticas públicas para esse público?
Por exemplo, eu chefio a residência de urologia do Hospital Getúlio Vargas, o único centro formador dessa especialidade no Estado. Nós já estamos indo para a segunda vaga, só tinha uma, isso já vai ser uma conquista. Segundo, é realmente favorecer, estimular que esse profissional que atue na capital também tenha condições de atuar no interior. Não só através de condições físicas, ter estruturas adequadas para fazer esses exames, essa avaliação, mas também estimular que esse especialista vá para o interior, nem que seja para ele passar uma semana lá e o restante na capital. Isso é totalmente possível, basta fazer um bom acerto entre a secretaria estadual e a municipal.
E o que mais o senhor vê que possa melhorar o acesso à saúde do homem?
No meu ponto de vista seria fundamental, já que hoje o homem é muito mais resistente que a mulher para ir ao médico, que essa campanha não fosse só em novembro, que fosse realmente o ano todo. Seria bom se as unidades de saúde, principalmente as unidades do interior, criassem uma campanha contínua de saúde do homem. Se você analisar bem, já existe para as mulheres. Você vê que a mulher sempre está estimulada a ir ao médico, o homem não. Tanto é que nós temos o Instituto da Mulher, que eu achei fantástico, mas nós não temos o Instituto do Homem. Então, a gente tinha que realmente ter um prédio, uma estrutura dedicada a saúde masculina. Isso também é um projeto que, quem encampar, vai deixar um legado.
Se a pessoa descobrir o diagnóstico precocemente, qual a chance de cura?
Hoje, com tecnologia robótica, com os novos exames para estadiamento, chega a 95%. É uma estatística muito boa para quem realmente quer ficar curado e não ter sequelas pela doença.